Farinha de trigo com gordura trans?
Origem: Panfleto intitulado “ A melhor pizza artesanal de entrega“ distribuído no Rio de Janeiro no início do mês de setembro de 2017
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Texto-resposta:
A propaganda acima infere que a farinha usada para produzir a massa da pizza neste estabelecimento é “livre de gordura trans”. Isso induz o leitor a pensar que somente a farinha de trigo utilizada por esse estabelecimento é isenta de gordura trans. Porém, toda farinha de trigo é isenta de gordura trans. Entende-se que, por ser uma propaganda, o intuito é chamar a atenção do consumidor. Ela provavelmente foi elaborada baseando-se em análise comportamental, na qual se percebeu um crescimento da adoção de hábitos saudáveis pelas pessoas nos últimos tempos e, com isso, quiseram enfatizar uma característica inerente à massa da pizza, objetivando chamar a atenção do público, em especial, daqueles que querem ou adotam hábitos de vida saudáveis. No entanto, a ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) estabelece que os rótulos e propagandas dos produtos alimentícios não podem destacar a presença ou ausência de componentes que sejam próprios de alimentos de igual natureza (BRASIL, 2005). Para que a informação da propaganda seja veiculada de forma correta, a informação correta deveria ser: farinha de trigo livre de gordura trans, como toda farinha de trigo.
Para quem se interessar em saber um pouco mais sobre gorduras trans, segue abaixo um texto sobre o assunto.
A gordura trans nada mais é do que ácidos graxos insaturados que apresentam em sua estrutura uma dupla ligação entre carbonos na presença de hidrogênio. A isomeria trans significa que os substituintes estão no lado oposto da dupla ligação, enquanto que na isomeria cis, os substituintes estão no mesmo lado da dupla ligação. Como pode ser exemplificado na Figura a seguir:
Figura 1. Estrutura química dos ácidos graxos saturados e insaturados cis e trans.
Fonte: SILVIA (2014)
A má fama recebida pela gordura trans é devido aos malefícios que ela pode acarretar à saúde. Porém, assim como os demais nutrientes, a gordura trans só causa danos se consumida em excesso. Se consumida de forma exacerbada, ela pode aumentar os níveis de colesterol LDL, conhecido como o “mau colesterol” e diminuir a quantidade de colesterol HDL, conhecido como o “bom colesterol”, no sangue. Logo, uma consequência do consumo excessivo de gordura trans é o possível aparecimento de doenças cardiovasculares.
Ácidos graxos com isomeria trans ocorrem na natureza, em pequenas quantidades em gorduras de ruminantes. Os ácidos graxos ingeridos por estes animais são parcialmente hidrogenados por sistemas enzimáticos de sua flora microbiana intestinal (processo de bio-hidrogenação).
Ácidos graxos com essa isomeria trans também podem ser produzidos pela indústria por meio da hidrogenação catalítica de óleos vegetais. O objetivo do processo é transformar o óleo, que é líquido à temperatura ambiente, em gordura, sólida à temperatura ambiente. Desta forma, o produto fica mais adequado à aplicação e apresenta maior estabilidade (prevenção do desenvolvimento de rancidez). Porém, com os estudos clínicos comprovando o malefício da gordura trans, a indústria de alimentos desenvolveu tecnologias alternativas para mudar o estado físico dos óleos vegetais à temperatura ambiente, sem que ácidos graxos trans estejam presentes.
É válido ressaltar que, no Brasil, é obrigatória a indicação da quantidade de gordura trans nos rótulos dos alimentos embalados (Brasil, 2003), sendo um item constante na Informação Nutricional do produto.
Referências Bibliográficas:
BRASIL (2003). Resolução-RDC Nº 360, de 23 de dezembro de 2003. Regulamento técnico sobre rotulagem nutricional de alimentos embalados. Diário Oficial da União, 2003. Disponível em: <http://portal.anvisa.gov.br/legislacao > Acesso em: 11 Set 2017.
BRASIL (2005). Rotulagem nutricional obrigatória: manual de orientação aos consumidores. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Disponível em: <http://portal.anvisa.gov.br/documents/33916/396679/manual_consumidor.pdf/e31144d3-0207-4a37-9b3b-e4638d48934b>. Acesso em: 21 Set 2017.
NELSON, L.; COX, Michael M. Princípios de Bioquímica de Lehninger. Porto Alegre: Artmed. 6. ed. Porto Alegre: Artmed, 2014.